segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Liberta-me

Eu tentei não manter certas fronteiras entre o que eu sentia e o que eu queria sentir. Inútil. Minha derrocada era eminente, desde o momento que eu decidi partir, e fiquei. E não pense você que me refiro a ter ficado aqui, não, me refiro a ter ficado sob a minha pele, sob os meus dogmas, sob os meus medos, as minhas incapacidades, minhas inseguranças, minhas frustrações, minhas carências, minha solidão. Tentei me desdobrar, e ignorar o que eu sentia, porque eu sabia que a distância era óbvia entre cada querer: digno e forjado. E eu me espelhei em ícones belos, aparentemente felizes, no desejo do outro. Mas eu não desejava, acima de tudo. Eu queria, mas eu não podia. Não posso amar o que não é meu, não posso amar o que não é inerente a mim, não posso amar o vazio imenso que se alarga no meu peito toda vez que eu insisto. Não posso amar o vazio, o nada, o oco, o vácuo. Não posso amar essa liberdade que sufoca, nem essa escolha que se impõe, nem esse ar que asfixia, nem esse fogo que não arde, nem essa mão que não acalenta, nem esse pão que não sacia, nem essa adrenalina que paralisa, nem essa verdade que omite, nem o sono que não vem, o sonho que não vem, o alivio que não vem.


Dá-me a sua mão, leva-me, olha-me, como eu olho, mas não vejo. Sinta-me como eu não sinto, como eu nunca senti. Passa a sua mão sobre esse medo da vida e esse medo que eu sinto de ter medo, de ter dor, de não ter nada. Beba da minha lágrima, e drene dela a culpa que eu sinto por esse egoísmo. Toca-me os cabelos, deita-me em seu colo e me faça dormir o sono de quem se recupera, não o sono da fuga. Pega-me no colo e leva-me pra casa. Beija-me o sorriso, e peça-me que fique. Dá-me a sua fé e a sua força. Liberta-me.

Assim seja.